Quem disse? Quem sabe? Extraordinário! Chocante!
A insegurança e o medo habitam a Europa. Prevalece o ambiente pessimista, algo melancólico até. O projecto europeu tem vindo a estiolar — e a perder força — porque os cidadãos europeus estão cada vez mais distantes dos seus dirigentes. Dirigentes ousados, corajosos e lúcidos, precisam-se. A desunião europeia não é nova. Mas diz tanto sobre a ‘democracia’ como acerca dos povos que a exercem. Os europeus não podem ser tratados como o velho Mao Tse-Tung tratava os chineses: como carne para canhão. Por toda esta Europa está a sentir-se um frémito de explosão social de camadas populares que já não suportam mais as insuficiências de políticas sociais ou os infortúnios de uma asfixiante crise económica. A globalização e a doutrina que a sustenta, o neoliberalismo, tem aumentado os problemas da miséria, da fome, do desemprego nas nações onde tem sido aplicada. Vão surgir novas formas de protesto social desconhecidas no século XX. A vulnerabilidade do Estado será visível em muitas delas. Fazer parar o país e colocá-lo à beira da fome, afinal, é fácil e, manifestamente, o Governo não sabe muito bem como impedi-lo. A política da globalização, tão apregoada como o supremo benefício da humanidade, abriu fossos abismais entre os mais ricos e os mais pobres: estes, tocam as raias da miséria; aqueles, uma existência sumptuariamente escandalosa. Criou-se um clima de maledicência geral que afunda o estado real do país e o clima social da sua população. Quanto mais se fizer passar a ideia de que o país está no charco, melhor. Esta democracia não está a ser a democracia da liberdade de opinião na procura do melhor ‘bem colectivo’ possível. Está a ser a democracia dos interesses. Portugal e os portugueses nunca foram tão pobres em democracia como na actualidade. Oh, se ao menos eu pudesse ter uma vida de sensações em vez de uma vida de pensamentos.


[Fonte indirecta: jornal Público em Junho e Julho de 2008]